SÉRIES FOTOGRÁFICAS
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Ao colocar o próprio corpo no cerne de sua investigação artística, tendo como ponto de partida a performance, Marcus Vinícius buscava criar uma série de situações a partir das mais diversas relações desse corpo com a arquitetura, a paisagem, a natureza, os espaços cotidianos, transfigurando os sentidos daquilo que nos é banal e corriqueiro, sempre com muita leveza e poesia a costurar suas múltiplas estratégias e inquietações. Um dos suportes mais presentes em sua produção é a fotografia – capturando o instante e as diversas modulações presentes nas experiências vividas, objetivando conexões afetivas, espirituais e até oníricas bastante próprias. Muitas vezes, especialmente durante residências artísticas em terras distantes, essas conexões se traduziam em séries fotográficas que criavam pequenas narrativas ao sabor da fluidez e do próprio colocar-se em movimento – afinal estamos falando de um sujeito em trânsito permanente pelo mundo, que experimentava com bastante frequência os afetos de paisagens muitas vezes experimentadas em toda sua intensidade pela primeira vez no momento do registro fotográfico.
Escolhemos aqui oito dessas séries fotográficas, nunca antes apresentadas publicamente na íntegra. Sete delas possuem a figura do artista como seu epicentro. Em Cicatrizes (2010), realizada durante uma viagem a São Luiz, no Maranhão, as marcas arquivadas na pele, decorrentes tanto das experiências físicas extremas suportadas pelo corpo quanto pelos desenhos traçados por tatuagens, dialogam diretamente com a memória silenciosa de casarões abandonados e das texturas, ranhuras e rasuras impressas em sua parede, nas sombras ou na estrutura exposta dessas edificações. Deseos e Cuerpo-Paisaje (ambas de 2011), são decorrentes da investigação e integração com a paisagem natural quase intocada, presente no Parque Nacional Nahuel Huapi, em Isla Victoria, na Patagônia Argentina, durante uma residência artística de cerca de um mês, realizada durante o outono. Diário de passagem (2010) explora as reverberações da interioridade diante da paisagem urbana e da arquitetura da tricentenária São Petersburgo, na Rússia, enquanto que Domestic Reactions (2011), fruto de uma residência artística realizada no verão escandinavo de 2011, na fronteira entre a Suécia e a Finlândia, acrescenta uma camada lúdica e bem humorada à banal beleza de utensílios de limpeza, muitas vezes relegados a áreas da casa pouco frequentadas ou retratadas no campo artístico. Everything imaginable can dreamed... (2012), realizada paralelamente ao vídeo homônimo, num outro casarão abandonado – desta vez em Buenos Aires, na Argentina, mergulha num espaço-tempo do sonho para instaurar outros sentidos para os signos daquele ambiente, convidando a experimentar os objetos em ruínas como se eles se transmutassem naquilo que o gesto de usá-los evoca, à medida que fossem tocados e usados. Contato (2009) e Bicho do Mato (2011), por sua vez, exploram uma conexão profunda com a natureza e a animalidade, a partir de associações bem mais intuitivas do que racionais.
Esta sessão também inclui um trabalho que, em lugar de apresentar a figura de Marcus Vinícius, foca em seu olhar, e no desejo poético de tocar e reter entre os dedos o intangível, ou que lhe está além do alcance das mãos. Silencio y Nubes (2008), trabalho de início de carreira, apresentado na exposição “Un ciel pour moi”, realizada em La Plata pouco depois do artista fixar residência na Argentina, aqui é apresentada junto aos outros dois vídeos que a acompanhavam nessa mostra, de modo a nos permitir vislumbrar não somente o conjunto, mas uma carta de intenções do próprio artista acerca de temas e poéticas que reapareceriam de várias outras maneiras nos anos seguintes de sua produção.